Verba destinada ao custeio das eleições corresponde acerca de 3 bilhões de reais e encontra, no Congresso Nacional, muitas divergências quanto a sua utilização na contenção dos efeitos da pandemia, já tendo chegado ao judiciário a decisão sobre sua utilização neste momento.

Inicialmente, é necessário brevemente expor o conceito dos fundos destinados ao custeio das eleições e dos partidos políticos. O Fundo Partidário foi instituído no ano de 1995 com o intuito de custear os gastos cotidianos dos Partidos Políticos, tais como, despesas com a manutenção das sedes, contadorias e assessorias, bem como, eventos realizados esporadicamente.

Os valores repassados à título de Fundo Partidário são arrecadados através de multas eleitorais aplicadas, doações, dotações de orçamento, e demais ingressos monetários previstos legalmente, o valor é repassado proporcionalmente aos partidos. A Lei n° 9096/1995 e demais Resoluções e Portarias do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), regulam a matéria.

Já o Fundo Eleitoral, é a verba destinada no custeio das eleições pelos Partidos Políticos, podendo ser utilizado apenas no ano do pleito. O Fundo Eleitoral foi criado para substituir os financiamentos privados de campanha e também tem repasse proporcional à representação partidária, a Lei Orçamentária Anual (LOA), de 2020, sancionada pelo Presidente da República, estabeleceu a destinação de R$ 2 bilhões para o custeio das eleições municipais em outubro.

As críticas aos valores destinadas aos fundos mencionados já ocorrem em qualquer perspectiva, uma vez que, em um país de pouca infraestrutura, é discutível o aporte de R$ 3 bilhões para Partidos Políticos que, não necessariamente, representam os anseios da população, aliado também ao descrédito atribuído à classe política nos últimos anos.

Diante do cenário da pandemia causada pelo novo coronavírus (Covid-19), aumenta a pressão para a utilização de tais fundos no combate e prevenção do vírus. Há argumentos prós e contras e defensores de ambos os lados, nessa toada, foi ajuizada ação popular com pedido liminar para que o Poder Público utilizasse tais para o combate ao coronavírus.

A 4ª Vara da Justiça Federal de Brasília, através do Magistrado Itagiba Catta Preta, concedeu a liminar, bloqueando os valores do Fundo Eleitoral e do Fundo Partidário e deixando à disposição do Governo Federal, sob o fundamento de que feriria a moralidade manter tais recursos estagnados, enquanto o país passa por momentos instáveis por conta da pandemia.

Entretanto, o Presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª região, Desembargador Carlos Moreira Alves suspendeu a liminar da justiça brasiliense, a pedido da Advocacia Geral da União (AGU), na época representada por André Mendonça, hoje Ministro da Justiça e Segurança Pública.

Na decisão, o Desembargador cita a necessidade de ações coordenadas de todos os entes do Poder Público para o combate da pandemia, além do desrespeito ao orçamento público já estabelecido no início do ano, interferindo na divisão constitucional dos poderes.

No Congresso Nacional, ao menos publicamente, a maioria dos parlamentares é a favor da utilização dos valores na pandemia, entretanto, o Presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (DEM-AP) criticou a utilização do Fundo no combate à doença, argumentando que valores muitos maiores já foram destinados para isso, e que as propostas de designação do orçamento eleitoral para uso durante a pandemia, são dotadas de populismo e oportunismo para se ganhar palanque.

O Partido Novo, que tem como política interna a não utilização de dinheiro público e afirmou ter R$ 34 milhões em caixa provenientes do Fundo Eleitoral e Partidário, consultou o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a possibilidade de destinar os valores à hospitais e ao Ministério da Saúde.

O Vice-Presidente do TSE, Renato Brill de Góes, respondeu a consulta e informou o partido que não há Lei específica para tratar sobre o tema, portanto impossível a utilização do fundo para outra destinação neste momento.

Analisa-se desse concatenamento factual, que há necessidade de se ter muita cautela ao tratar sobre o tema, sendo importante abrir a discussão sobre uma eventual liberalidade de cada partido para doar ou não o montante arrecadado através dos fundos eleitoral e partidário.

No entanto, até mesmo essa deliberação indubitavelmente encontraria óbice junto aos partidos contrários à medida, já que, a opinião pública pressionaria todos os partidos a destinarem o valor ao combate do Covid-19, apoiado no fundamento global, já utilizado em tempos normais, de que a população custeia partidos que, sequer, concorda com as práticas e objetivos contidos nos estatutos.

Por outro lado, ainda é cedo para traçarmos os caminhos eleitorais do ano de 2020, porém já se ventila a discussão sobre a realização ou não das eleições municipais em outubro, por conta da alta circulação de pessoas durante a campanha, e ainda, as aglomerações nos dias de votação.

Importante mencionarmos também, que há um caráter democrático nos Fundos Eleitorais e Partidários, dando oportunidade para partidos menores terem melhor representatividade e mais espaço nas eleições, evitando o domínio de grandes legendas.

As alterações legislativas visando a liberação de tais valores para uso na pandemia, já caminham no Congresso Nacional. O Senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) assinou Projeto de Lei para viabilizar tal medida, ao passo que, o Senador Major Olimpo (PSL-SP), apresentou Emenda à Medida Provisória 924/2020, editada para enfrentamento emergencial do coronavírus.

Denota-se, que a princípio, não há possibilidade legal para utilização do Fundo Eleitoral e do Fundo Partidário no combate ao Covid-19, sendo importante, por enquanto, a destinação de montantes de outra natureza para o tratamento durante a pandemia.

Obviamente, que caso o cidadão sofra financeiramente, mais do que já está sofrendo, como por exemplo, no caso da instituição de Empréstimos Compulsórios por parte da União contra grandes empresas, como é o caso do Projeto de Lei Complementar n° 34/2020, de autoria do Deputado Wellington Roberto (PL-PB), que é imbuído de várias inconstitucionalidades, a utilização do dinheiro público dos Fundos Partidários e Eleitorais é medida que se impõe.

No cenário que se apresenta, até atitudes que parecem óbvias, devem ser analisadas com cuidado, evitando impactos catastróficos no futuro e buscando as melhores saídas para o combate da pandemia.

Leonardo Herbert